Não te olhei uma única vez desde essa despedida porque te despiste em ramos de mel que me afastam com as lágrimas do teu arrependimento. Destruíste a esperança que me deste e cultivaste ódios e medos dentro de nós. Fizeste-me egoísta. Cortaste-te a pele. Retiraste-me segundos de paz e fizeste-me morrer. Durante anos, morto. Para sempre, morto. Morto porque me despiste, sim. Morto porque me tiraste a única luz que alguma vez me fora fiel. A única que me alimentou e se deixou conhecer. Na naturalidade do tempo, nesses buracos infindáveis do tempo, ficaste gravado em ti mesmo e o reflexo será para sempre o desuso próprio do teu saber e do caminhar. A experiência ficou, o resto morreu. Ela mesma, deturpada, morreu. Morto. Eu.
domingo, 20 de dezembro de 2009
Não te olhei uma única vez desde essa despedida porque te despiste em ramos de mel que me afastam com as lágrimas do teu arrependimento. Destruíste a esperança que me deste e cultivaste ódios e medos dentro de nós. Fizeste-me egoísta. Cortaste-te a pele. Retiraste-me segundos de paz e fizeste-me morrer. Durante anos, morto. Para sempre, morto. Morto porque me despiste, sim. Morto porque me tiraste a única luz que alguma vez me fora fiel. A única que me alimentou e se deixou conhecer. Na naturalidade do tempo, nesses buracos infindáveis do tempo, ficaste gravado em ti mesmo e o reflexo será para sempre o desuso próprio do teu saber e do caminhar. A experiência ficou, o resto morreu. Ela mesma, deturpada, morreu. Morto. Eu.
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
...
Sobre o leito das flores engasgado
Como o sol à noite embalsamado
Nessa cortina assim fugiu.
Uma dança de sonho no gelo esguio
Pela turbina do céu aconchegado
Uma miragem nas nuvens de sangue frio
Uma palavra vazia do mau olhado...
Formas essas esculpidas de pecado
Entre relâmpagos satíricos de heresia
Nessa asa que fica no ideado
Na nau ferida em fantasia
Num escárnio tétrico se ria
Num mar de chamas devaneado
Morrendo assim mais um dia
Na diafaneidade do sagrado
Inspiração pessoniana
No tempo em que era são sem palavras,
No tempo em que, sendo criança, era eterno,
No tempo em que ser criança era estar no teu jardim...
No tempo em que tudo era nada...
(e nada...era tudo...)
Toda a esperança era um não-saber encantado,
Todo um viver impuro...
No tempo em que tudo era nada...
(e nada...era tudo...)
Toda a infância era o saber desencantado,
Todo esse sorriso um poço inseguro...
No tempo em que o passado era o presente congelado,
O futuro uma aliança frisada,
No tempo em que o futuro não era sequer,
O passado nem se sonhava...
Nem os astros no tempo,
Aquele que pertence ao momento,
Nem os não-seres do pensamento,
Nem o tudo, nem o nada,
Nada, tudo dado...nenhum julgamento!
No tempo em que era teu sem receio
No tempo em que eras meu num luzir
Num tempo em que o hoje era o nunca
Num tempo em que o alegrar era o teu partir...
Num tempo distante sem luz
A luminosidade era o vento,
Num tempo passado em que o morrer era viver
Deixei-me apagar, deixei-me morrer
...No tempo que hoje nem chave é, no amanhã é o esquecimento...
...No tempo que hoje é o tema, no amanhã será o grito agudo e lento...
terça-feira, 10 de novembro de 2009
Tempo
Um segundo apenas para mudar o mundo
E saudar o que não existe
E o que partiu e ainda por cá está.
Pedi ao tempo uma saudade.
Uma dança pela liberdade.
Pedi, pedi e ele sorriu.
Escrito algures lá atrás no tempo
Lugares ao sol
(como se saltinhos desse)
E envolvo-me na paz da Noite,
Canto-me sem quaisquer palavras
E balanço no silêncio eterno
Em que aquele mundinho insiste em ficar.
Adapto-me a um sonho,
Com o sol em meu redor,
Como se luz tivesse em ouro,
Como se tudo mais fosse furor.
E encanto-me nas escadas que não existem
E oiço as marés sempre gritar
Pedindo sonhos aos que resistem,
Pedindo vida além mar
E das horas que sei que ali vivi
Não perdi qualquer momento
A liberdade desde então jaz em mim
São palavras, um sentimento
E com os cobertores em mim envoltos
Adormeço na luz que eles são
Abençoada pelas palavras sem corpos
A partitura do coração
De diante uma gaivota
O toque do rei-luz em toda a verdade
Voa em mim em tons de corvo
Em lugares ao sol, uma saudade.
Escrito algures lá atrás no tempo...
Coisas pequeninas especiais
Escusado será dizer que me comoveu. Fez-me lembrar momentos sentados no chão da sala a olhar muito atento para a televisão. Momentos em que tinha de fazer tratamentos específicos para a visão e a minha mãe fazia de tudo para conseguir um cruzamento entre o estudo, a animação e os devidos exercícios para a vista. Eu de pala no olho, com cadernos na mão, tv ligada e uma mãe ali, sempre pronta a escorrer gotas de suor, entre lágrimas e desespero, a fazer o impossível para que eu sentisse um pouco de tudo. E sentia. Sorria, arrepiava-me, aprendia, comentava, apontava, desenhava, escrevinhava, respondia... Era um conjunto de minutos em que me activava e me abstraía. Em que juntava o útil ao agradável. Em que aprendia a aprender a ser nessa circulação imensa de sangue, bactérias, hormonas, compilações de substâncias negras e brancas, brincadeiras entre bens e males. Era crescer.
A Rua Sésamo iniciou-se em 1969, há 40 anos exactos, nos Estados Unidos da América com Jim Henson após todo o seu trabalho com outro grandioso espectáculo: Os Muppets - quase uma espécie de ante-visão do que viria a ser a rua encantada dos meninos pequeninos e dos meninos que não gostam ou não querem ser grandes.
Apresentada em cerca de 120 países, a Rua Sésamo chegou, adaptada ao condomínio português, vinte anos depois do seu nascimento (1989), fazendo também hoje no nosso país os seus 20 anos de existência.
Entre fantochada, animação, acção, activação, fantasia, exploração, educação, magia, arte, consciência, racionalização e, acima de tudo, prazer, rapidamente se tornou uma saga nacional entre crianças e adultos tanto para cobrir os interesses e desejos dos pequenos como as necessidades e apreciações dos adultos. Quatro temporadas vividas durante cerca de 4 anos a tapar lacunas escolares (consta pouco mais de 30% de sucesso na altura - disfarçado no agora mas enfim).
A bem dizer, talvez tenhamos perdido a vida com a perda da vida de uma pequena localidade fantasiada nos pontos bons e maus que a comprometiam. Hoje o que temos é restos de imaginação e tentativas de exploração de arte. Novelas, desenhos animados e publicações cada um deles pior que o outro. Não temos a mesma aspiração. Em parte, evolução, em parte, suicídio.
Choro por dentro ao recordar. Vivo por dentro o que vivi. Cresço por dentro com cada gota do que já havia crescido. E agradeço. Sempre. Cada uma das palavras e cada uma das cores do arco-íris que me facultaram na altura.
Palavras para quê? Who cares...
... Maná maná!
sábado, 7 de novembro de 2009
domingo, 25 de outubro de 2009
Perguntas parvas
Quando te vêem deitado, de olhos fechados, na tua cama, com a luz apagada e perguntam:
– Estás a dormir?
– Não. Estou a treinar para morrer!
Quando levamos um aparelho electrónico para a manutenção e o técnico pergunta:
– Está avariado?
– Não. É que ele estava farto de estar em casa e eu trouxe-o a passear...
Quando está a chover e vais sair de casa, perguntam:
– Vais sair com esta chuva?
– Não, vou sair com a próxima…
Quando acabas de te levantar, vem um idiota e pergunta:
– Acordaste?
– Não. Sou sonâmbulo!
Quando um amigo teu liga para tua casa e pergunta:
– Onde estás?
– No Pólo Norte! Um furacão trouxe a minha casa para aqui!
Quando acabas de tomar banho e alguém pergunta:
– Tomaste banho?
– Não! Dei um mergulho no vaso sanitário!
Quando estás a pescar, alguém passa e questiona:
– Pescaste todos esses peixes?
– Não! Esses, são peixes suicidas que se atiraram para o balde!
Quando estás na paragem d'um autocarro, alguém te reconhece e pergunta:
– O que estás a fazer aqui?
– Estou à espera do metro para ir para casa!
Quando estás na caixa e tiras um talão de cheques e o caixa olha e pergunta:
– Vai pagar em cheque?
– Não! Vou escrever um poema nesta folhinha!
Quando acabas de olhar para o relógio e alguém te pergunta:
– Viste as horas?
– Achas!? Estava a ver a novela!
Quando estás a ir com uma bola para um campo, alguém pergunta:
– Vais jogar?
– Não, vou estourar pipocas!
Quando pedes para uma pessoa assinar um documento e ela diz:
– Assino o meu nome?
– Não, assine uma fórmula química qualquer…
Quando alguém tem um acidente e vai para o hospital:
– Está a sentir-se bem?
– Claro, vim só ver se aqui nevava...
Quando telefonas a um(a) amigo(a) e explicas que não foste ao cinema porque foste ao funeral do teu tio:
– Oh! O teu tio morreu?
– Nãaaaaaaaaaaaaaao! Achas? Nós só fomos la ensaiar.. para quando ele morrer não chorarmos fora de tom...
Está alguém a andar a volta do Santuário de Fátima de joelhos e alguém pergunta:
– Está a pagar promessa?
– Não não. Estou só a fazer esfoleação aos joelhos.. tirar as células mortas...
Estás a passear algures e de repente alguém vê-te e pergunta:
– Estás aqui!?
– Não, sou uma miragem, não vês que estou ali?
A força do vício
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
Mas não fica por aqui. Que tal um cartão para os gogos mais fofinhos?
Não é tão giro? «Let's be depressive with meow meow's painted in pink! Yay xD». Será, no mínimo, a minha próxima aquisição. Só não fui antes porque o meu gato mais novo watranhou a moda e ficou traumatizado. Quando os bigodes deixarem ele diz que me larga e logo poderei tratar da coisa (destruir todos os que me aparecerem à frente!)
Eléctrico
Bus
Porque é merecido estar aqui!
terça-feira, 6 de outubro de 2009
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
E foi isto.
Os anos passam. O Ser cresce. A estimulação caminhara numa via constante. A idolatração, o ridículo. É acima dos outros. É melhor. Merece. Pode. Quer. Manda. Todos falam do ser já em fase alta do crescimento como o tal, como o eterno, como o eleito. E esse ser? Essa pérola...
Entre quatro paredes deitado, às escondidas do mundo, pinta a realidade de branco, por vezes de transparente quando quer saltar para o mundo vizinho tão igual ao seu, e pinta na sua mente as palavras que não sente e o ódio que tanto quer para si. Os arranhões, as marcas, o desprezo. Detesta a realidade. Todos o adoram. É simpático, bonito, inteligente. Activo, vivo, inerente. E no entanto esconde o mundo que não sente e mente para si na união.
Olha o mundo lá fora e isola-se no seu sangue. O comprimento da razão é o pequeno cavalo feito de papel que se encontra pendurado no tecto da cama, no andar de baixo do pensamento. Depressa corre para o ponto preto que desenhou em tempos no canto superior esquerdo da parede do fundo. A janela fica em frente e todos os dias corre por ela abaixo de um 28º andar de um fantástico prédio à beira-macula, rodeado de latas movidas a vigor, numa elevação constante dos corpos. Não se sente triste, não se sente feliz. Na cadeira do fundo, está o seu melhor amigo. Invisível, mudo, cego. Pensa que não anda mas como nunca lhe perguntou não sabe. Acredita que não e bem lá no fundo é nisso em que quer acreditar. A mão direita é feita de árvore e o olho esquerdo foi queimado num ensaio ao nascimento. O pé esquerdo é feito de plástico. às vezes mexe e faz uns barulhos curiosos que relembram o tic tac do vácuo. Não se sabe se é ele que o promove ou se é reflexo do seu circuito ou antes do circuito terrestre. Costuma acreditar que o seu umbigo é o centro do mundo. Talvez igual ao ponto desenhado pelo Novo Ser. Uma pequenina matéria rodeada por órbitas transparentes também elas rodeadas por camadas de cebola, agreste e saborosa, pintada de luz algures no céu. No chão, por debaixo do armário, tem escrito que a escuridão é uma fórmula de amizade. Lá do outro lado, nas quedas do 28º andar, tem escrito que o chão é o local mais bonito da globalização. Costuma pintar-se de algodão. Cor de chave de fendas. Às vezes com odor a grená. E atrás de si há sempre uma sombra que lhe diz que o ama. Há sempre alguém que lhe dá a mão.
Quando alguém entra no quarto, porém, tudo se esconde. Ele deixa de ser ele. O Novo Ser deixa de ser o Novo Ser. Quem o olha traz sempre o formoso sorriso. Quem o fala deixa sempre a sua lágrima cair. Olham-no ao espelho e embelezam-no no seu todo e ele chora de nojo. Por dentro decompõe-se. Derrete de sonho e sangra de fedor.
Escrevem-se pequenos poemas de morte e de dor. Do fim. Ele vive tudo isso enquanto vive e conhece tudo isso melhor que ninguém. Quando acorda em seco sabe que morreu mais uma vez e quando adormece e volta ao seu mundo sabe que chegou ao fim. Em três passos, corta a linha que o segura e quando olha para trás já é tarde para dizer que ama e que é feliz mas ao menos pôde mostrar tudo quanto podia, sobre cada passo, cada pedaço de mel que o agarrou ao glúten da sua vida.
Por fim, quando perde a cor de jovem e acarta em si o fardo de humano adulto, a sexualidade conta-se pelos dedos. Número zero na sua razão. Quer-se sozinho e sente-se enojado com cada pedaço de orgasmo que se ouve nas ruas por onde vai passando. O cheiro a droga atrai a sua veia e sente-se orgulhoso por o saber sexo e não o querer para si. No entanto conhece a Senhora Puta do 37º andar que desce todos dias as escadas do prédio amarelo, feito de bulor. Um bulor bonito pintado de amarelo. Uma senhora casada com um senhor também ele de mesmo apelido. Ambos não têm uma mão, não têm um pé e perderam um dos lados do genital que tinham. Não sabem porquê nem como mas sabem que gostam de sexo, idolatram o sexo, e que não o fazem, de todo e em tempo algum, por dinheiro. Despem-se todos dias e admiram os seus corpos com o mundo. A última vítima agradada terá sido a nuvem de azul. Às vezes vê-se da janela do 28º andar a adaptação da senhora nuvem. Parece uma vagina em forma de botija ou por vezes um pequeno lápis dobrado ao meio mas um pouco mais inchado. Quando o Novo Ser lhes disse que gostava muito deles eles perguntaram-lhe de imediato qual era a sua posição preferida. Quantas vezes tinha chegado ao pico da razão astral no odor transparente da transpiração do corpo. Ele sorriu e disse nunca. Eles não perceberam. Como poderiam perceber? Perguntaram se ainda assim já tinha experimentado. Acenou. Deixou-se violar há poucos meses por um intersexual pintado de encarnado. Era escuro o local. Parecia cheirar a aguardente mas na verdade era sujidade de cano roto. O intersexual perguntou-lhe na altura porque se havia deixado violar e ele sorriu. Não respondeu. Detestou o que sentiu. Detestou cada momento. Detestou cada partícula do seu corpo e cada frase dita pelo apaixonado. Pelo intersexual em deleite vago de satírica morta. Porém, dentro de si a máscara pintara-se de verde e desenhou um ponto no lado oposto ao já existente. O seu amigo perguntara-lhe porque o fizera e ele apenas disse que lhe apeteceu. A Senhora e o Senhor Puta não entenderam. Como podiam entender. Afinal, gostavam de sexo. Gostavam de dar o corpo ao mundo. Gostavam de estar sem estar mesmo gostando sem gostar. Como poderiam eles entender?
Os anos passaram e um dia matou o patrão. Quis devorar o sabor da morte. Toda a gente pensou que o patrão o havia atacado. Afinal detestava toda aquela perfeição. Invejava o Q.I. mesmo com capacidades superiores. Invejava a postura mesmo com uma melhor. Invejava o sorriso, o corpo. Invejava tudo mesmo sendo do mesmo sexo e assumidamente heterossexual. Invejava tudo e esse foi o seu crime. Pelo menos assim ficou registado. Todavia o Novo Ser ria baixinho. Apático no dia a dia, não gostou ou desgostou do acto. Aconteceu. Odiava-se a si, odiava o mundo mas não desejava mal a ninguém. Aconteceu. Olhou-se ao espalho e lembrou-se da morte. Lembrou-se da violação do patrão à empregada cega de 90 anos. Lembrou-se da escuridão por detrás dos olhos zarolhos do patrão. Lembrou-se da heterossexualidade. Lembrou-se do poder. Lembrou-se da mão do patrão a tocar-lhe no quarto. Lembrou-se das palavras do patrão nos ouvidos guardados do seu melhor amigo. Lembrou-se das mesas vazias à noite porque os empregados não podiam estar. Lembrou-se do sexo vazio mesmo que não gostasse dele. Lembrou-se dos filhos que não nasciam mesmo que isso pouco lhe importasse. Lembrou-se do mundo e aconteceu.
Mais tarde, o seu melhor amigo perguntou-lhe porque é que falava com os ratos e um dia resolveu mostrar ao amigo já sem partes do corpo e ele, o Novo Ser, com cabelos grisalhos e rugas por todo o lado, até mesmo no genital não apreciado e na unha gigante do pé de cima. Apresentou-lhe o sem nome. Disse-lhe que era um nome bonito. Admitiu que admirava o facto do senhor rato não ter nome nem bigode nem nariz nem cauda. Admirava-lhe o facto de já ter morrido 3 vezes. Admirava-lhe o facto de ser sujo e doente. Admirava-lhe o facto de ter família igual. E acima de tudo. Não. Ainda mais acima do que isso, admirava o facto de haver sido cobaia numa experiência laboratorial e ter sido abandonado na rua. Não lhe importava o resto. Admirava tudo isso. E todos os outros ratinhos de nome incerto e capacidade algures entre o infinito e o inexistente admiravam-no também. Alguns eram melhores que ele. Outros odiavam-no ferozmente. Outros já o haviam tentado matar. Outros até foram objectos sexuais nas mãos desse ratinho. E ele nas suas. Mas admiravam-no. Admiravam-no porque não existia. Estava lá mas era como se não estivesse. Era um milagre. E era esse milagre, todos eles, espalhado por todos os canos do universo e por todos os electrões da eternidade que o fazia falar com os ratos. Ir para o buraco mais escuro, fechar os olhos, viver o seu mundo e ao mesmo tempo, na sua mais real realidade, na sua mais eterna poesia, rebentar as veias do ódio ao adorar falar com os ratos.
Um dia foi condenado à cadeira eléctrica. Descobriram o seu paraíso. Pintaram-no de carvão. Despejaram água no topo do chapéu cinzento cheio de fios e pintaram-no de carvão. Pensaram que os pedaços de história que haviam conhecido eram feitos de poder. Eram feitos de insanidade. Eram feitas de aguarela divina. Perceberam que ele era o que sempre tinha sido e nesse perceber não o compreenderam. Juntaram-se ao antigo patrão falecido. Desta vez pessoas de todos os sexos, cores, tamanhos e mundos. Juntaram-se-lhe. Morreram com ele ao matar quem os matara. Acabaram a história em branco e despiram-se todos para morrer sozinhos. Os ratos ficaram. Segundo consta, também havia formigas e algumas baratas. Cada uma delas mais bonita que a outra, cada uma delas mais feroz. Cuspiram a carta algures e apagaram o mundo. O seu melhor amigo pela primeira vez chorou e pela primeira vez percebeu que não andava. Não via mas tudo era claro e a audição só precisava ser transparente. Os ruídos por detrás do silêncio eram a mais preciosa melodia e a extensão dos fluídos elásticos dentro do aperto sempre apertado traziam-lhe paz. Sabia que estava morto mas que nunca iria morrer e que estando só nunca iria estar. Derreteu e ficou pintado em cada pedaço da cebola onde a escuridão era sem dúvida uma fórmula de amizade e onde a memória não existia mas vigorava por desnascer.
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
chuva da mente
Preso entre quatro paredes de um mundo ainda mais pequeno, entregue a ironias surreais, transparentes, numa microprodutividade exaustiva. Uma saliência de tortura amarga, entre labirintos fúnebres de nitrato de sódio, uma combinação de pó sob a forma de molécula - pequenas partículas que nos fazem voar mais alto - em ilusões satíricas, entre nós e esse alterego que nos persegue, numa coima pessoal de mentiras, numa combustão letal, paráfrase desse nosso odor. O fim.
O oxigénio eleva-nos numa combinação de prazer, ao pico orgásmico dessa droga adulterada, sepulcros lânguidos de cal viva em forma de pecado. Eleva-nos, sim, ao ponto de tocarmos o céu rasgado, perfurando camadas sucessivas de agonia, num conjunto complexo de pânico, medo, sufoco e heresia. Uma demão de euforia, outra de docilidade voluptuosa. Um fado garantido e aceite pelo eu que não se toca, que se não sente. Influxo a si inerente, automatiza-se, degenera-se, vincula-se no autómato, no inconsciente da razão. Priva-o de tudo, rasga-lhe a pele, apodera-se do seu odor, do seu código, da sua chama. Acelera-se num padrão oscilante entre os milhares e os milhões de quilómetros por hora. Até que tudo se torna branco. A calma humedece, vigora, idolatra-se. O déjà vu é a única prece que nos resta e o que dele se pinta, o ópio para o novo desassossego, numa cruzada que nos fará escalar as montanhas, as torres, o labirinto económico, o grito da paz. Far-nos-á ir ao topo através da única fórmula rasa que nos regenera: a esperança, essa mesquinha e fugaz inocência humana do desconhecimento, da impotência. Olhamos na perspectiva da luz e focamos o que para lá dela não se vê. Abrimos os braços, abrimos o peito, erguemos a tola e cuspimos o mundo. Esquecemos quem somos por um segundo e gritamos no sítio onde mais ninguém nos ouve. Quando é hora, acordamos. Olhamos o pequeno mundo nessas quatro paredes e quando nos vemos abandonados na super auto-estrada dos milhares no velocímetro, olhamos para baixo e vemos o nosso sangue onde mais ninguém o vê, arrefecido pela penumbra, arrefecido pela ignorância, esquecido pelos fadistas da corte da estratégia suburbana, num caos inerente à aversão primitiva, numa corte de jóias e de cólera que nos pinta de roxo numa máscara anarca, num jogo de cintura que nos colhe os véus.
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
terça-feira, 1 de setembro de 2009
domingo, 23 de agosto de 2009
terça-feira, 11 de agosto de 2009
sábado, 4 de julho de 2009
sábado, 13 de junho de 2009
domingo, 7 de junho de 2009
quinta-feira, 4 de junho de 2009
quarta-feira, 3 de junho de 2009
The Happiest Day
My seared and blighted heart hath known,
The highest hope of pride and power,
I feel hath flown.
Of power! said I? Yes! such I ween
But they have vanished long, alas!
The visions of my youth have been--
But let them pass.
And pride, what have I now with thee?
Another brow may ev'n inherit
The venom thou hast poured on me--
Be still my spirit!
The happiest day--the happiest hour
Mine eyes shall see--have ever seen,
The brightest glance of pride and power
I feel have been:
But were that hope of pride and power
Now offered with the pain
Ev'n then I felt--that brightest hour
I would not live again:
For on its wings was dark alloy
And as it fluttered--fell
An essence--powerful to destroy
A soul that knew it well.
domingo, 31 de maio de 2009
sábado, 30 de maio de 2009
quarta-feira, 13 de maio de 2009
Pãosinho
Por outro lado, lembrei-me do famoso pão de domingo que mais parecia um búzio gigante.
Apeteceu-me torrar pão e resolvi experimentar a nova qualidade que a minha mãe trouxe da feira. Levo a mão ao saco para retirar uma bolinha, no típico totoloto alimentar, e sai-me esta maravilha com um pé gigante e uma disposição farinácia ainda mais interessante. Deixo aqui a prova artística:
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Derrame
De cálices erguidos na voz de fusões
Uma raiva picotada no ópio do segredo
Essa fonte incomensurada, essa raíz de medo
Sabe a pouco ouvir a escuridão lá fora,
Sabe a pouco esta voz que o povo ignora,
Essas palavras pintadas em melodias de mel,
Palavras cravadas dia a dia neste bordel
Sugando odores exteriores em estímulos de magia
Acordando horrores que se fixaram um dia
Entre portas e arados que desenharam o véu
Nessa tranca amargurada de que pintaram o céu
Trancados e apunhalados nesse quarto de heresias
Alimentados por cegueiras que mais parecem mentiras
Ninguém nos ensina porque não há nada para ensinar
Sobem no poder por o poder não saberem estruturar
E no meio de tanta palavra, os livros do pecado
Onde se grita direito por entre linhas do imaginado
Essa vontade que choca os mais sensíveis
Nessa raiva de monstros irascíveis
Somos filhos bastardos desse clamor social
Somos olhos incendiados desse furor descomunal
Choros sanguinários de espíritos abandonados
Revoluções astrais de limites desencontrados
Desenterramos vítimas, choramos história
Nessa chama de vento, nesse pico de glória
O ponto x do genocídio capitalista
O ponto x desse momento de fadista
E porque despista no meio da multidão
O sangue, a imagem, a coragem da união
Essa falta de activismo, de obstinação
Essa falha crucial do mundo novo da revolução
Guardamos o sofrimento na caixa da ventura
Esquecemos por momentos a nossa veia mais pura
Trazemos nos braços essa ira psicopata que esse véu abençoou
Esse mentor anónimo desse grupo para o qual nunca ninguém olhou
Enquanto me enveneno neste rancor
Leva o povo lápides do fruto do amor
Entre pulpitos e vontades, caminhos e desigualdades
Nesse brio que o mal ergueu, nessa revolta de oratória que o inferno ardeu
Receosos pelo mundo, receosos pelo ser
Nesse cheiro moribundo que nos fez falecer
As mentiras da paz, o estrondo da memória
Liberalismo que nada faz, democracia de que reza a história
Anarquias, fusões, direitas e onirismos
Rebelias, destruições, seitas e empirismos
As teias contínuas desses demónios corruptos
As veias indigenas desses seres abruptos
Imperialismos da vontade, terrorismos de fantasia
Fachadas da liberdade, sorrisos da ironia
Entre cálices de veneno erguidos pelos média
Que pintam impávidos as palavras dos mérdia
Igualando mentes pelo saber iluviso
Já que assim o dizem, nesse surrealismo depressivo
Quebrando labirintos, quebrando enigmas
Adormecendo instintos, matando estigmas
Deixemo-nos de parasatismos sociais
As odes do povo são os braços matinais
Neste inferno que alicia a dor
Nessa vontade da crise que tanto masturba o opressor
Nos orgasmos da pátria que prefere a imagem da frente
Nessa jornada pela tecnologia, nesse jogo eloquente
Flagelando carnes e sorrisos nessa voz de amor
Onde o mundo virou colmeia desse mel de terror
quarta-feira, 6 de maio de 2009
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Rainha de um Leito
Cor de pele e muitas cores
Entre sombras, apagada
Sorrindo máscaras e furores
Um tumulto, longe farda
Uma obrigação, um querer
Dois em um na livre estrada
Desta sina nossa que é viver
Olhas-me de cima e no tempo do saber
Por entre chagas, lutador,
Prendes-me às cortinas, vês-me falecer
Boémio de morte, mal-feitor
Entregas-te ao todo da alegoria
E dizes em voz alta que a Natureza trouxe a luz
E tu és origem Santa de tamanha magia
Um corpo eterno que teu olhar seduz
No nono leito barafustei
No décimo sorria com medo
Até às sete badaladas fui ninguém
E tu fonte de letal segredo
Leva-me contigo na eternidade
Seja Amor ou poeira de tempo
Leva, leva, fria deidade
Leva-me e vive, queixume livre do fingimento.
Três pontinhos...
[...Talvez...]
terça-feira, 5 de maio de 2009
pontinhos
A escuridão era cortada pelos antigos candeeiros da cidade. Num cubículo, mulheres mal feitas, de juízos desprotegidos, entregues ao mundo cristalino da ilusão. Noutro, homens pecadores de sangue frio. No desrespeito no olhar. Melodias ferozes no silêncio do lá e acolá. Ruídos desconhecidos.
Um canto perdido. Perdido algures. Destroçado, mal apanhado. Faz talvez lembrar um canto de sodomia infantil. Um verso sem ponto, uma linha em nada.
Aí, dois seres. Um perdido na arte, o outro no banal, no comum. Um perdido na revolta, outro na inocência do desconhecimento. Um, chorando, outro, ingénuo, sorrindo nas palavras. Um Amando, outro morrendo. Um morrendo, outro amando.
Gritos sinceros de cada um deles com aspiração à união e à existência. Com aspiração à ode pessoal e à ode colectiva. As brincadeiras das palavras, dos jogos de espaço e do tempo que não existe... Um passo em vão ou uma facada... O desatino do fazer e do não fazer.
Chegada à praia. O mar. O vento a soprar sobre as ondas e a gritar que os fanatismos da humanidade na modéstia que não existe e no sentir que é pecado são abolidos pela desonra de ser infiel à verdade, à realidade, ao todo, ao pensamento.
Caminhadas algures onde havia pegadas. Seguindo passos do antigamente. Unindo o tempo e sendo perfeito. Ao longe, os anos-luz pintados sobre Regulus ou Skat e laborando a piada da veia do inconsciente, sempre viva, sempre real...
Um grito, uma faca. Um berro de pavor e um escárnio de prazer carnal sempre entre a parede e o tempo. O espaço e as horas. O Eu e o Vós. A desgraça e o furor. O prazer natural transformado em ódio e em euforia. A vontade de ser feroz e superior aniquilada pelo ódio e todo o desalento.
Dizem que as pessoas são feitas de ar e que a luz provem da matéria que se compõe em spicatos de genes e substâncias epopeicas. Dizem que a brisa carbónica e hidrogénica se completa com astros que nos caem nos corpos e nos formam as células.
Eu pinto a eternidade do nada. Esse pelo menos é eterno e é meu. Não, não sou egoísta. Todos temos os nossos. Mas este é particularmente um todo só meu. O beijo da lealdade cortou-me a vontade de seguir rumos concretos. Apetece-me esculpir sentires e deixar-me ir. Talvez um dia tudo mude e até o nada seja eu...
'Blind with no heart,
'Das Herz ist eine Sünde,
'Vous êtes un rêve,
'Non ho orecchi,
'Trazes-me a sorte,
'Et une coeur déshabillé,
'I have my feet on my head,
'Mein aufgewickeltes Herz,
'Senza qualsiasi luce,
'Und die Augen im Darm,
'A Natureza quadrada,
'Le doigt sur la fleur,
'And the work went well,
'Mein Kopf hat keine Farbe,
'E siete inferno,
'O luto de mim,
Se eu pudesse voar...
Punha as mãos no parapeito e atirava-me. Deixava-me cair sempre no mesmo modo com que tinha calhado atirar-me. Sentia o vento no rosto e o barulho ao fundo a ser cortado pela velocidade da queda. Deixava-me ir até ao último segundo e erguia-me, voando sem limites até ao mais alto dos lugares. Lá, veria tudo e entoar-me-ia por completo para todos poderem sonhar. Cantava-vos com as melodias dos astros e nas rotas das cores sorria, embalado pelo ar...
Regressava e passaria as 24 horas do dia em que assim estivesse em voos pelo mundo. Agarraria na mão de quem comigo voar quisesse e não pararia nem um segundo.
No final, deitar-me-ia numa nuvem. Daquelas nuvens cheias de trovoadas escondidas e de chuvas que nos vêm acariciar e ficaria assim... assim... assim...
Horas que me esfriam a mente...
Os sussurros do passado aliciam-se à dor
Palavras minhas, em letais fingimentos
Do torno eterno do gelo e do Amor
Frio na era que erra em harmonias
De voz constante, a luz, a cor
Nas baladas da Noite das reais fantasias
A foice de tempos, o enorme louvor
Nas recordações do que sei que viverei
Neste passado que em hora futuro foi
Saberei cortes, castelos e suspiros
Do saber ameno do sol que se põe
Com tanta estrela, tanto brilho
Na hora confusa de complexo sabor
Uma honra de fogo, um esboço de perigo
Uma náu à deriva, um testemunho, fervor
E em sonhos que tenho e desconheço
Em cada palavra que dito e erro
Sei com tanta imagem que em infernos padeço
Por às palavras falhar e não saborear seu clamor...
...The Pit and The Pendulum...
Em memória de...
A dor da despedida é eterna, sempre assim comigo foi e hoje, passadas semanas várias de uma despedida sem adeus, sinto ainda o vazio de quem nos deixou porque preenchia mais do que provavelmente se fazia crer... As implicações de um sistema como o nosso, cheio de buracos e cheio de incompetentes que não os tapam, custam vidas, custam sensos e louvores a nada... Hoje o preço é a saudade, a raiva e a dor... Amanhã será a naturalidade preta de quem fica vazio... Na hora, foi o saco disforme do alívio pelo fim do sofrimento e da revolta pela luta que tanto levou e, ainda assim, face ao surgimento de um pequenino pormenor, tudo colapsou... A triste realidade nem é tanto a partida nem é tanto a lágrima da saudade. A triste realidade é o motivo de tudo e o facto de no fim nem sequer importar... As pessoas não aprendem com os seus erros. São ignorantes e verdes ao ponto de não saber o que isso é ou sequer o que é uma aprendizagem, o que é crescer. Vivem no medo e no típico 'who cares' e o dia de amanhã é apenas réplica de um sucesso sucessivo de sucessos que sucedem sem cessar... Dizia a história, afinal somos todos pequeninos e barbaramente ridículos... In fact, 'we're just people, we're just people, we're just people...'…
Por outro lado, um dia contaram-me que a vida terminava para uns e para todos e que o tempo, porém, não era limitado e a incerteza nada mais era que uma falésia presa à eternidade. Um esboço de complexidade que se recheia no próprio emergir do tempo e da saudade, sentida a partir do primeiro momento em que tudo muda na realidade que nos acompanha, que é nossa, por nós, em nós.
Sentidos esses que me ultrapassam com fragmentos de nada, inspirações absolutas e surreais. Um paralelismo universal sem forro, totalmente despido, enclausurado...
Porém, acredito eu que tudo o mais traz verdade. Desconhecida por nós mas parte de muitos outros. Traz, sim. Traz muito mais.
Talvez um dia também encontremos esse outro mundo, essa outra realidade... Até lá... A formosura de não estar só, no cuidado do fado de nós para os outros...
Um forte bem haja ao sangue que se foi, um grande abraço a quem hoje uivará também...
Dream Within A Dream
And, in parting from you now,
Thus much let me avow-
You are not wrong, who deem
That my days have been a dream;
Yet if hope has flown away
In a night, or in a day,
In a vision, or in none,
Is it therefore the less gone?
All that we see or seem
Is but a dream within a dream.
I stand amid the roar
Of a surf-tormented shore,
And I hold within my hand
Grains of the golden sand-
How few! yet how they creep
Through my fingers to the deep,
While I weep- while I weep!
O God! can I not grasp
Them with a tighter clasp?
O God! can I not save
One from the pitiless wave?
Is all that we see or seem
But a dream within a dream?
Edgar Allan Poe (1827)
segunda-feira, 4 de maio de 2009
Coisas lá de trás - sagas
Nessas cores de saudade que não se evapora
Parece que em dia foi feita a hora
Dessa fantasia que é uma Vida.
E de cigarro ao peito com o furor da alma
A transparência da vontade jaz energia
Sem luz à Noite, quebrada vidraça
De torpedos em vós, tal melodia.
Sem cor até, a vida é longa
O fado da guitarra que não fica em si
Lago de fundos, que voz medonha
As claves que ficam de um do-re-mi...
___
Pedi ao tempo que parasse por um segundo.
Um segundo apenas para mudar o mundo
E saudar o que não existe
E o que partiu e ainda por cá está.
Pedi ao tempo uma saudade.
Uma dança pela liberdade.
Pedi, pedi e ele sorriu.
___
Lá fora está o senhor de muitas cores.
Está alto e bonito a cantar com a chuva e o sol. Eles dançam. Dançam e a Lua que se avizinha também entoa alguns sons de balada temporal.
Lá fora o senhor de muitas cores saiu para brincar.
Oh, mas ele vai-se embora. Desaparece entre as nuvens e diz que volta um dia para nos abraçar.
É bonito, sorrio, é bonito.
[E todos cantarolando o acompanharam à procura do pote de algodão...]
22.01.07
Brisé e seus fundamentos
Sometimes there's a part of me that dies...
Longe do mundo, apetece-me fazer algo diferente. Realizar momentos estranhos e surpreender-me com nadas. Coisas de matéria alguma que possam ser cercadas de horrores.
[Salvo seja a verdade de querer o que nem sei o que é...]
Parece tormenta, mas é um sorriso porque esta Noite te vi num topo entre felicidade e nostalgia. Parece o que não é pelo que sinto.
Sabe bem ter-te perto e viver assim.
[Ao revés daqueles que, mesmo de sangue, chegam para me rasgar a pele!]
Porque me apeteceu...
...
Senhores das boas horas...
Quando os olhei do lado de lá da estrada estavam pintados como se fossem um arco íris a preto e branco e quando voltei a olhar tinham gotas transparentes ao seu redor.
(É incrível como não disseram uma única palavra...)
Tentei fugir deles mas consegui tudo menos fazê-lo. Até que me rendi e adormeci onde nada fazia sentido...
Esses...
Quem são...?
Quem são esses...?
sexta-feira, 24 de abril de 2009
Take my hand tonight
Take my hand tonight one last time
...
domingo, 19 de abril de 2009
sábado, 18 de abril de 2009
Quero mais momentos destes...
Hoje, acordei de um pulo e quis logo vestir-me para ir brincar com a bicicleta como já há muito tempo não fazia.
Crianças a brincar às seis da manhã nas ruas de Lisboa.
Mal saí de casa, uma brasa de frio imenso queimou-me as mãos e fez as minhas pernas tilintar. Olhei para a minha menina e pensei "saudade desta sensação".
Aventurei-me por Lisboa e as crianças brincavam às seis da manhã nas suas ruas.
Era incrível! Todas elas pareciam ter acordado com a vitalidade que há muito não se fazia sentir em seus corações e, na saudade de a poder aproveitar, lançavam-se como vulcões pelas ruas, deixando-as quentes e deliciantes.
Eu ia-me movimentando pelas várias ruas. Olivais, Alvalade, Campo Grande, Telheiras.
Uma criança caiu. Estava a tentar imitar os grandes profissionais de Parkour. Um jovem aventureiro, será bom dizer. Tentou subir uma árvore e lá em cima tentou um salto e uma cambalhota. Quando aterrou, magoou-se. Será bom dizer também que eu o vi no salto e o pequenote conseguiu fazer tudo bem feito. O resultado final é que não foi famoso, mas certamente se orgulhará daquela lesão. Aventureiro era ele e vontade de conseguir também não faltava!
Continuei o meu percurso e dois meninos juntam-se a mim. Olham para mim enquanto pedalam ferozmente as suas bicicletas para me acompanhar e eu sorrio. Eles retribuem os sorrisos e esforçam-se ainda mais. Abrando e eles ultrapassam-me. Vão até ao topo daquela rua vazia e fria, onde só os pais estavam a ver.
Descida. Eu apanho balanço. Já sozinho, apanho balanço e subo depois o pico. Volto a descer, levanto-me e retento colocar os pés sobre o corpo da minha senhora. Não cheguei a tirar as mãos do volante (ainda é cedo, ainda é cedo!). Mas pus-me em pé!
Volto ao banco, aceno aos miúdos e vou-me embora. Na saída pensei que talvez eles quisessem imitar-me. Arrependi-me e voltei atrás. Passei por eles mais uma vez. Eu sabia que eles vinham ter comigo! Demos duas voltas e antes de me ir embora "Não façam travessuras. Ainda é cedo para tentarem pôr-se em cima da bicicleta. Treinem o equilíbrio em casa e um dia eu ensino-vos!". Qual não foi o meu espanto quando um dos pequenos muito espontaneamente esboça a interrogação de desespero, da união entre dor e alegria, dúvida e vontade: "prometes?". Sorri e disse "Prometo". Pisquei o olho e estiquei a mão aos dois para que ma apertassem. Pegaram nas suas bicicletas e foram. Eu ando um bocado, olho para trás e, claro, se esperava, estavam os dois, todos contentes a tentar o equilíbrio. Já com as bicicletas encostadas ao muro, junto aos pais, treinavam o equilíbrio e iam caindo para aprender. Sorriam e aqueciam também aquelas ruas (e aqueceram-me a mim) - Agora, às sete e picos da manhã.
De volta à estrada. Saio de Telheiras, caminho por Campo Grande, Entrecampos, visita a Campo Pequeno, Saldanha, El Corte Ingles. Ruas frias e vazias... Nem uma criança. Nem uma pessoa. Só carros, carros e carros! (ali só há pessoas para ir às compras. Não aquecem nada. Nem o próprio centro comercial... Ele é que aquece aqueles corações vazios. Não todos, alguns. A maioria...).
Arrepiado, pirei-me dali. Volto ao Campo Pequeno e passo pela faculdade. Incrível como já tenho saudades inclusive de escrever durante duas horas inteirinhas os ditos do Banha - grande homem! (palavra que não é graxa!) - e as divagações quilométricas do Caramelo!
Lá fui para Entrecampos novamente. A estação já estava mais agitada também. Pessoas a ir para os trabalhos. Crianças a deixar de aquecer as ruas para passar a aquecer as escolas. Ambulâncias mais vivas. Polícias parados a observar o nada e muito provavelmente a pensar no tempo da Maria Cachucha e dos feitos do Forrobodó... Os taxistas dentro dos seus taxis com frio. Alguns aventureiros a reclamar sobre a vida e sobre a falta de clientela para levar pelas ruas de Lisboa... "Continuo a preferir a minha Mikelina, confesso", penso.
Lá volto eu às ruas do Campo Grande e de Alvalade. Recordo os tempos que ali passei, como recordo sempre que lá vou, seja dia sim, dia não ou dia sim, dia sim. Volto pelo relógio e lá vou eu para os Olivais. Ainda antes de entrar na rua de casa, vou pela rua abaixo para subir o Vale do Silêncio. Não havia grande movimento.
Já no Vale, corriam, pulavam, aqueciam e dormiam. Muitas pessoas. Gosto sempre de passar por lá porque há um senhor dorminhoco que gosta de me ver andar de bicicleta. Como não tem tempo, conta o meu e sorri quando faço records. Fiz duas, três subidas e como estava cansado, despedi-me do senhor. Atirei-lhe uma moeda enquanto lhe piscava o olho e o sorriso esboçado fez-me subir com a força de quem acabou de acordar rejuvenescido o que faltava.
Já na minha rua, nem sinal de crianças, nem sinal de adultos, nem sinal de nada. Completamente vazio. Que frio, que frio!
Fui à padaria buscar o pão das nove, voltei para casa, tomei um duche, comi uma maravilha quentinha e fui dormir.
[O tempo está pintado de cinzento, mas a vida não perdoa o sorriso de voltar...]
»»Uma boa pérola de fim de ano! Talvez, a melhor... Talvez...««
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
Conheço tão bem o teu corpo
Sonhei tanto a tua figura
Que é de olhos fechados que eu ando
A limitar a tua altura
E bebo a água e sorvo o ar
Que te atravessou a cintura
Tanto, tão perto, tão real
Que o meu corpo se transfigura
E toca o seu próprio elemento
Num corpo que já não é seu
Num rio que desapareceu
Onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
Mário Cesariny
Suvetar - Goddess Of The Spring
Suvetar hyvä emäntä (Suvetar, fine matron)
Nouse harja katsomahan (Arise to see the seeds)
Viitimä emännän vilja (Raise the matron's corn)
Kun ei tuskihin tulisi (So that we may be spared pain)
Manutar maan emänätä (Manutar, matron of the Earth)
Nostele oras okinen (Lift up the shoots from the ground)
Kannon karvanen ylennä (New shoots from the stumps)
Kun ei tuskihin tulisi (So that we may be spared pain)
Syöttele metisin syömin (Feed us with honey-hearts)
Juottele metisin juomin (Give us honey-drink)
Mesiheinin herkuttele (Delicious honey-grass)
Vihanalla mättähällä (On a blossoming knoll)
Siull on helkiät hopiat (You have shining silver)
Siull on kullat kuulusammat (You have glistening gold)
Nouse jo neitonen (Rise up, O maiden)
Mustana mullasta (Black from the soil)
Akka mantereen alanen (Underground crone)
Vanhin luonnon tyttäristä (Most ancient of Nature's daughters )
Pane turve tunkomahan (Make the peat shoot forth)
Maa väkevä väantämähän (And the ground turn over)
Akka mantereen alanen (Underground crone)
Vanhin luonnon tyttäristä (Most ancient of Nature's daughters)
Tuhansin neniä nosta (Lift up a thousand seedlings)
Varsin vaivani näöstä (To reward my efforts)
terça-feira, 14 de abril de 2009
terça-feira, 7 de abril de 2009
Essa outra realidade que tantos esquecem e muitos desconhecem
Dado dia passei pelo Bairro (aquele local de ruas altas e barulhos muitos, entre sujidades e odor às impurezas da alegria) e tive um tempo de conferência com um dos senhores que estavam na altura dedicados à associação de estudantes da FCSH. No meio de vários assuntos saiu a questão LGBT. Já havia ouvido falar que se pensava dar vida a essa temática na faculdade mas ainda não estava a par dos planos e, portanto, quis perceber. Tudo muito bonito e de louvar mas as inevitáveis falhas da ignorância sobre o tema levaram-me a escrever o que se segue. Talvez um dia, nesses planos futuros, lhes fosse/seja útil, senhores estudantes dedicados.
Na verdade, não será demais dizer que cada caso é um caso e que nenhum peca pela falta de valor que tem. Todos diferentes, assentam igualmente em toda uma necessidade de batalha a ser travada. Porém, talvez também desentendido na área, do pouco que vi há que salientar que a minoria T (esses labels of mind...) está muito mais na penumbra que as restantes minorias deste mesmo grupo. Antes de partir para a questão do que será verdadeiramente essa letra, é importante dizer qual a sua designação. Esse T tão pronto a cair nos debates sociais, tão esquecido e desconhecido, significa não transsexualidade, como me havia dito o rapaz da associação, mas sim transgenerismo. Achei, pois, por bem, depois de me ter dedicado à homossexualidade na altura, escrever agora sobre este tema, que sinceramente me preocupa mais ainda que o anterior.
Ora então, o que será esse palavrão? O que quererá isso dizer? Para ser simples e directo, transgenerismo é a ruptura dos papéis de género tradicionais (dos clássicos homem e mulher), que estão, claro, ligados à noção de sexo biológico, esperando-se a partir daqui que uma pessoa se comporte de determinada maneira, consoante cidade, família, hábitos e costumes em que tenha a sorte (ou o azar) de nascer/crescer/viver. Porém, o ser humano é muito mais que um rótulo, que uma definição, que um papel de género. Tudo isso, defendo eu, limita-o e ofende-o no ‘para lá do que se vê’. Há, de facto, toda uma necessidade, como se vê desde há anos, de misturar ambos os papéis, tentando equilibrar o nível social de ambos os géneros. Há uma necessidade de atenuar a guerra dos sexos. O transgenerismo é, porém, muito mais do que isso. É o termo atribuído a todas as pessoas cujo comportamento é diferente dessas medidas que se impingem desde a nascença a meninos e meninas. É, portanto, o que vai naturalmente contra a maré social.
Falar de transgenerismo torna-se complicado porque se entra na área do psíquico. Uma parte de nós que nos ultrapassa (sim, nós ultrapassamo-nos a nós mesmos). A área da identidade. Pegando num trabalho que uma senhorita uma vez me apresentou, imagine-se um gráfico em que um dos eixos é precisamente a linha da identidade. As extremidades equivalem ao ponto base do ser humano: de um lado o homem, do outro a mulher. Tudo o que compreende os restantes pontos desse eixo são os milhares infinitos de formas e apresentações possíveis de níveis de identidade. Todo um processo de masculinização e femininização o poderá explicar. Não somos todos iguais e, de todo, seremos pequeninos.
Ora, se efectivamente temos pontinhos e mais pontinhos de identidade, teremos também várias expressões de transgenerismo. E, mais, há inclusive transgenerismo laboral quando pessoas de sexos diferentes vestem o mesmo tipo de roupa, sendo que esta é uma divagação e não uma sub-categoria transgénera.
Antes de partilhar convosco os grupos de que tenho já conhecimento, será importante salientar que se pode dividir o transgenerismo em dois grupos: transgéneros que se baseiam na realidade tradicional homem-mulher e transgéneros que assumem que ‘homem’ e ‘mulher’ serão apenas e só mais dois dos vários milhares de géneros existentes. Uns assumem um papel de acordo com o esperado por um dos géneros na sociedade, outros assumem-se tal como são, por vezes, num jogo entre ambos os papéis.
Deixo frisado que cada caso é um caso, mas aqui ficam alguns dos casos que conheço (e peço desde já a quem ler que caso saiba de outros casos ou tenha uma qualquer objecção, não tenha quaisquer problemas em mas apontar, ficar-lhe-ia, pelo contrário, bem grato):
Cross-dresser: Pessoas que assumem os papeis sociais, como roupas e alguns comportamentos do sexo oposto. Não interfere na sua orientação sexual nem tão pouco no seu corpo. Assumem-se com o género com que nasceram biologicamente, mas a sua apresentação é toda ela oposta à norma social. É uma questão fetichista (e até erótica se quisermos) e, mais importante, não é de cariz sexual.
Drag king/queen: Será mais uma fantasia. Fantasia que poderá ser expressa a nível de trabalho, do espectáculo ou de um costume de máscara, por exemplo. Diz-se de Drag King uma mulher com roupa de homem e de Drag Queen, um homem que vista roupa de mulher. Também este caso não implica alterações corporais nem orientação sexual x, y ou z.
Transsexual: uma pessoa que sofre de uma disforia de género em que o físico e o psicológico são antagónicos. Neste caso poder-se-á passar ou não por um processo de readaptação corporal, sendo que a tendência é para que se passe. É uma disforia que invalida toda uma realidade e que sem uma readaptação será um sufoco. Relativamente à orientação sexual, também aqui esta será independente da identidade.
Travesti: Actualmente, para ser simples e directo, um travesti é um transexual que não passa pela tal readaptação corporal. Em tempos seria os ditos Drag kings/queens, mas hoje é a transexualidade que não passa pelo processo hormonal e cirúrgico. Também não implica uma qualquer orientação sexual.
Andrógino: Características de ambos os géneros, tanto física como psicologicamente, num único ser, não dando sequer para dizer a qual dos géneros pertencerá. Pode também ser uma disforia de género em que, por toda a implicância psicológica, também o comportamento terá os seus manifestos condicionados. A orientação sexual também aqui é independente.
Intersexual: É a pessoa que nasceu entre o sexo masculino e o feminino, tendo parcial ou completamente desenvolvidos ambos os órgãos sexuais ou um predominando sobre o outro, assim como poderá ter este duo sexual do género a nível interno. Temos, portanto, uma componente cromossomática e gonádica diferente que se reflectirá numa caracterização genital e pubertária diferente, assim como a nível psicológico terá eventuais consequências comportamentais claramente advindas da avaliação social de ambos os géneros. Há casos de igual evolução da genitália e casos de graus diferentes de evolução predominando um dos géneros. A nível de orientação, também poderá ser homo, hetero ou bissexual (e, claro, também assexual).
Hermafrodita: Componente avaliada exclusivamente a nível físico, portanto, científico, tratando-se da pessoa que nasce com dois órgãos sexuais de géneros opostos. É a origem do termo 'intersexual', diferenciando-se ambos por um ser mais amplo que outro. Este é muito mais restrito, não sendo sequer considerado uma forma de transgenerismo pela maioria. Nascendo com dois géneros, opta-se por um (normalmente os pais) e a criança é logo ali trabalhada. O problema é saber, em ambos os casos, se as coisas se ficam por aí e se mais tarde não haverá um choque comportamental na criança. Daí ter escrito 'trabalhada' e não 'readaptada'. Orientação sexual também ela independente.
Como se viu, em nenhum dos casos houve ligação directa entre transgenerismo e orientação sexual. Qual será então a diferença entre homossexuais, bissexuais e transgéneros?
Como disse quando falei da homossexualidade, os homossexuais femininos e masculinos são pessoas que sentem atracção emocional e sexual por pessoas do mesmo sexo e os bissexuais são pessoas que poderão sentir atracção emocional e sexual tanto por alguém do sexo masculino como por alguém do sexo feminino. Já os transgéneros são, como disse, pessoas que rompem com a norma social. Nisto a grande diferença prende-se com orientação sexual e identidade de género. Perguntar-me-ão, poderá um transgénero ser gay ou bi ou se uma gay ou bi poderá ser transgénero. Certamente, assim como um heterossexual poderá ser transgénero e vice-versa. São coisas verdadeiramente diferentes e independentes.
Fala-se igualmente em modas e em doutrinas quebradas mas a verdade é que a evolução é constante e a etologia explica-a sem paradoxos, sem barreiras. Desde sempre que entidades várias da existência orgânica revelam estes padrões corporais e afectivos. Animais que se auto-reproduzem, que se auto-transfiguram para conseguir a cópula com as suas desejadas presas do amor, animais que sugam a homogeneidade do género, animais que reflectem exactamente esas questões. São essas sombras do tempo que nos indicam o como, adaptativamente, num fenómeno evolutivo constante, tudo o que hoje temos, na complexidade da nossa espécie, pode ser facilmente explicado sem no entanto recorrer aos cânones da ciência.
Por outro lado, as várias personagens humanas da histórias, heróicas ou não, de civilizaões desaparecidas ou ainda presentes, igualmente nos indicam que todo este «drama» não é de agora e toda esta luta de conveniência pela sádica convenção ideológica desse brado que é o Homem não é mais do que um sucesso sucessivo de tentativas abafadas pelo fachismo do género, pela cobardia racional.
As portas abriram-se ao longos dos tempos e os horizontes, nestas e noutras áreas, igualmente se alargaram. Hoje, temos ópio nas mãos e celas por todo o lado. O conhecimento alastrou e a continuidade do tradicionalismo devora-o. Num nihilismo quebramos quem somos e tão só nesse momento esquecemos que alguém pode já ter morrido ainda antes de ter começado a viver. Transgenerismo é exactamente isso. Legal ou não, aceite ou não, trabalhado ou não, facilmente pode passar de um cordão liberal, do poder da vontade, a um jogo de celas pela prisão do próprio corpo nesse labirinto que é esse ferrete, jogo indelével, do vínculo sexual.