quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

É com grande espanto que sempre olhei para esta época. Penso que quando era pequenino ainda cheguei a acreditar que o senhor da barba branca e das renas mágicas vinha de lá dos mundos mais distantes benzer-nos com prendas por felicitação espirito-comportamental. Lembro-me de ficar à janela à espera e a pensar que a melhor prenda era a de me tirarem de onde estava, de me retirarem o que sentia e de me darem estabilidade. Nunca o recebi. Ano após ano, sem qualquer outra oferta, o que me era concedido era o esbanjar de dinheiros. O ridículo esbanjar de dinheiros. Consolas, jogos, bolas, bonecos, livros, chocolates, roupas e mais roupinhas(...), mimos. Mimos que vinham até daqueles que não conhecia. Chegavam e ficavam ali. Como simbolo, como marca. Pensava para comigo motivos para tal oferenda, sobretudo quando o conteúdo nada tinha a ver comigo. Aos poucos e poucos fui-me apercebendo do contexto da época, do seu sinónimo, do seu significado e, em tempos, esta atitude ganhou alguma forma na minha consciência e comecei a conseguir aceitar. Igualmente, compreendi que o desejo primário nunca merece ênfase num dia em que o símbolo é tão só a mão do Homem. Deixei-me de crer, deixei-me de sonhar. Rendi-me ao que tinha como lucro e ao que me era doado e deixei-me ir.Pouco após os meus 10/11 anos, comecei a sentir na pele o que era a saudade, o que era uma despedida. Senti na pele a amargura da existência e do vazio. Nesse contexto, olhei para o mundo e desenhei uma nova forma desta época de renascimento. Aprendi a desgostar das ofertas, dos doces, do banquete, do simbolismo. Passou de esperança a hipocrisia. Aos poucos deitei-me nesse abismo. Deixe-me esquecer qual o seu valor. Lembro-me de mais tarde, por volta dos 14 anos, ganhar nova noção. A hipocrisia aumentara mas o simbolismo também ganhou nova forma. Aprendi que o Homem só serve para deturpar factos e momentos e entreguei-me à natureza, na sua mais tenra forma, e sublinhei a época como um renascer e um reencontrar de um ponto pessoal. Passava em família por mais que a família longe disso estivesse. Aprendi a mostar-me presente por mais que me custasse a união com cada um dos seus membros. Aprendi a não querer prendas, a não ter esperança, tão só a dar. Dar no acto e não na forma. Dar no abstracto e não no material. O objecto era tão só o bem dizer, o bom sentir. A falácia, qualquer outro símbolo, qualquer outra vontade.Actualmente, não sei definir o Natal na boca de quem o fala. Não sou cristão, não sou católico, tão pouco sou cocaólico. Ao pensar no que sou ou deixo de ser, fica tão somente o nada e é nesse nada que fica o Natal. Não, não é vácuo, não é vazio. Não é o nada que fica no tétrico de um abismo incomensurável. É um daqueles vazios que alicia porque nos dá sem saber ao certo o quê nem como. A hipocrisia fica, o mal olhado cresce, o simbolismo morre mas a vontade cultiva-se. Sei-me parte de um todo que não me pertence nas linhas cruciais da minha existência mas o meu todo, é a minha parte. Não ligo de todo às chamas da fogueira nem às luzes que cintilam entre flocos de plástico e figuras históricas cuja realidade se desconhece e tanto abomina.Não me interessa qualquer dos laços que se estabelecem entre papeis coloridos e caixas recheadas de gula, boémia, malvadez e materialismo. Comporta-me a saudade de ser criança, o brilho da estrela que vinha honrar a nossa existência, que vinha limar uma nova era, um novo caminho. Ao longe, fica uma história por contar e um sentir que humedece os olhos. Não por dor mas por comoção. Arrepios medonhos entre os pés e a cabeça, entre os olhos e os tornozelos, em cada buraco esculpido no peito, em cada grito de felicidade. É assim que jaz o Natal em mim, na união mais pura com aqueles que tanto amo, odeio ou desconheço. Não importa qual a linha que se segue, qual o padrão desse simbolismo. É um período de sentimento, de reflexão, de paz. O teor tão só pertence a quem o sente, o motivo, de pouco importa, o resto é a definição aparente nesse jogo sujo de quem vê e tanto mente. O Natal é nascimento, é renascimento, é união.

4 comentários:

Themis* disse...

Para mim é morte, choro, riso e dor. Um misto de sensações causada por uma perda que é associada a esse dia. Sinto saudades da inocência, da ignorância que me fazia sentir "feliz" nessa altura, mas tal como tu, o tempo e a consciencialização do que a época de facto significava destruiram qualquer hipótese de poder voltar a sentir algo semelhante.
Agora, a época é só uma época como outra qualquer, o dia é passado em família, mas o que mais gosto é poder passar s dias que envolvem a data fatídica com pessoas que realmente gosto e com quem de facto me preocupo.

Corvi Umbra disse...

Essas sim, a minha derradeira família. Obrigado por te partilhares -)

Anónimo disse...

O Natal é só um dia e todos os dias devem ser comemorados por ti e pelos teus. Carpe Diem. A festa é um teatro e as dignidades contam-se pelos dedos. Aprendi contigo a não estar sozinho porque mais que um irmão és um amigo e é isso que marca a verdadeira família e é isso que significa o verdadeiro Natal.

Corvi Umbra disse...

Se eu soubesse o que sei hoje... Mas tens razão ou pelo menos eu dou-ta.